segunda-feira, 30 de julho de 2012

A "cousa"


           " É sabido que um dia, sem mais nem menos, todos nós iremos nos “separar”. E daí açoitará aquela saudade de todas as “cousas” [para não dizer “coisas”] que fizemos juntos, bem como as que deixamos de fazer: conversas jogadas fora, as descobertas, as aspirações, os devaneios; lembranças, até mesmo dos momentos de lágrima, de angústia, das vésperas de finais de semana, de finais de ano, enfim, do companheirismo vivido, dos risos e dos momentos que foram compartilhados. Hoje, mais do que nunca, não tenho dúvida disso... Em breve cada um parte e segue o seu caminho, segue a sua vida.
            A saudade [palavra exclusiva da língua portuguesa], as boas lembranças ou recordações, apertarão dentro do peito. A vontade de ouvir a voz novamente para se sentir “completo”. Daí, experimentaremos o que estar à margem dos sentimentos. Sentiremo-nos afastados, desistidos do amor de um alguém que está somente em nossas lembranças (que é nossa “vaguidão específica”): uma ilusão que esconde outra ilusão. Passarão incorruptíveis horas, dias, semanas meses e anos; serão percorridas subidas e descidas. Veremos que percorremos retas, nos apoiamos nas curvas, deparamos com experiências que serão, até cá, até a leitura dessa escritura, as alavancas para  obtermos a alegria de chegar ao destino projetado. 
            Ora, apesar desses fragmentos, que são (re)significados a todo momento, ressaltamos em nossas mentes o vocábulo saudade. Isso mesmo, aquele termo já-mencionado que é a razão pela qual a despedida nos dói tanto. Talvez seja porque, mesmo no limiar das nossas dúvidas e (in)certezas, nossas almas são (inter)ligadas antes mesmo do nascimento. São ou tenham sido ou sempre serão. Talvez seja essa a representação ou imagem mais recorrente dentre as várias ideias rastreadas no âmago, ato ou faculdade de pensar: nós vivemos mil vidas antes desta e em cada uma delas nós nos (re)encontramos. Temos a sensação (mesmo que leve) de que a vida inclui a todos, indistintamente, na participação dos “destinos” uns dos outros, mas que, contraditoriamente, ou no momento menos esperado, exclui o que antes estava (ou ao menos achávamos que estava) incluído. Então, veremos que o nosso eu, o nosso sentimento, vulgo amor (o amor “simbólico”), tornou-se uma ficção construída na ânsia de acreditar que necessitamos da presença do outro, estar à vista do outro, no pensamento do outro, constituir o outro (apesar de sermos “constituídos” uns pelos outros), para que um dia torne-se possível o compartilhar, o dividir. Temos a necessidade de habitar sem habitar; sendo dois, mas tendo a impressão, a ilusão de em alguns momentos, de tanto amor, tornamos um, mesmo que seja numa fração de segundos. Às vezes desejamos ir tão a fundo que nos dá a impressão de saturação dos sentidos, dos sentimentos, o que gera a (in)certeza do que sentimos.
            Mas a certeza que também temos é a de que nos é permitido guardar uma leve consternação, somada ao ato mental pelo qual a memória reproduz um fato passado, seja bom, seja funesto, no qual não nos será proibido confessar que às vezes nos recônditos do nosso ser, essa consternação nada mais é do que um amor e uma forma de demonstrar (por meio de um lapso) que houve momentos “perfeitos”, que jamais serão abafados, submergidos, escamoteado, apagado de nossa lembrança. Que passaram, mas que não se perderam, porque marcaram nossa vida, porquanto nos constitui.
            Daí, perguntamos, apesar de falar de uma “cousa” que em geral é inquestionável, a nós mesmos: Para que explicações? A resposta é simples: Por que queremos pensar e discorrer sobre nossas comiserações, emoções, compaixões, pois nossas palavras tropeçam, confessam, e revelam uma verdade de detrás. Mas, por vezes, nos enganamos, pois que nos “deslembramos” de falar das pequenas “cousas”, já que o silêncio torna tudo menos penoso. Lembramos apenas das coisas douradas e de duas pequenas palavras: até logo.  Pequenas, mas que se alongam como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo..."

Texto publicado por uma pessoa que possui grande influencia em minha vida: meu querido amigo e irmão Willian Diego de Almeida.

Um comentário:

  1. Ual, que texto mais lindo! Estou maravilhada!
    Apesar de estar clarinho(tenho astigmatismo e tenho problemas com letras parecidas com o fundo), eu selecionei todo o texto e consegui ler. De início pensei que não, mas o texto é tão bom que eu nem prestei atenção na formatação.

    Gosto de textos assim. O mundo precisa de textos assim! Muito bem escrito, de uma verdade incontestável. Dê meus parabéns à esse ser brilhante.

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